1 - fundamentos da logística

conteúdo original: silva, i. L.L.; fundamentos para gestão da produção: o mínimo que você precisa conhecer; São Paulo; ed. do autor; 2024;

1.          Fundamentos da Logística

Existem algumas versões para a origem da palavra logística: alguns autores afirmam que ela é originária da palavra francesa “loger”, que significa “acomodar”, “alojar”, enquanto outros autores afirmam que é derivada do grego “Logos” (razão) que significa “a arte de calcular”.

A aplicação inicial dos conceitos de logística como a entendemos hoje ocorreu dentro do militarismo na organização da aquisição de materiais, manutenção, transporte, equipamentos e pessoal.

Por se tratar de uma área abrangente dentro da administração pode-se encontrar inúmeras definições para logística. Para limitar as opções considere a definição dada pelo Council of Logistcs Managements:

“A logística é o processo de planejamento, implantação e controle do fluxo eficiente e eficaz de mercadorias, serviços e das informações relativas desde o ponto de origem até o ponto de consumo com o propósito de atender as exigências dos clientes” (Council of Logistics Managements)

Para uma organização desempenhar sua atividade econômica invariavelmente terá de organizar os fluxos de informações e materiais dentro de seus processos, e é basicamente disso que a logística trata.

Na empresa industrial, a atuação do que se compreende como logística tem uma relação muito próxima, e muitas vezes conjunta, desenvolvida pelo mesmo setor, que as atividades relacionadas ao PCP. Ambos tratam a gestão do fluxo de materiais para a empresa, a grande diferença é que o PCP tem seu foco na gestão deste fluxo dentro da organização e através de seus processos, e a logística trata do fluxo para que os materiais cheguem e saiam da empresa, e enquanto ainda estão aguardando nos estoques para serem processados.

Enfim, a atividade de um estende e complementa a atividade do outro, sendo muitas vezes inseparáveis. Como o foco deste material é a gestão da produção, serão abordados aspectos não contemplados na seção que tratou do PCP.

Sob esta perspectiva, o entendimento para o conceito da logística é o conjunto de atividades que planejam e executam o fluxo de informações e materiais necessários ao funcionamento da empresa (tanto internamente quanto externamente, excluindo-se a parte relacionada ao PCP).

A compreensão e definição do conceito de logística não ocorreu “da noite para o dia”, foi um processo de desenvolvimento demorado.

Por um longo período aplicou-se o conceito gerencial da logística considerando apenas as questões organizacionais internas da empresa e seus relacionamentos externos diretos, mas isso se alterou à medida que sua aplicação ganhou intensidade dentro do empresariado.

Esta alteração se deu em função de que ao longo do tempo o conceito de logística se expandiu para abranger também as diversas relações entre as empresas que estão dentro do que chamamos de Cadeia de Suprimentos.

A cadeia de suprimentos considera não somente uma única empresa de forma isolada administrando suas questões logísticas, mas também sua interação e relação com as outras empresas que estão dentro desta sua cadeia produtiva.

A este conceito mais abrangente deu-se o nome de Gestão da Cadeia de Suprimentos, ou em inglês, Supply Chain Management (SCM). Vamos considerar a seguinte definição:

“O gerenciamento da cadeia de suprimentos é definido como a coordenação estratégica sistemática das tradicionais funções de negócios no âmbito de uma determinada empresa e ao longo dos negócios no âmbito da cadeia de suprimentos, como o objetivo de aperfeiçoar o desempenho a longo prazo das empresas isoladamente e da cadeia de suprimentos como um todo.” (Mentzer et al., 2001)

          Para simplificar o entendimento, pode-se dizer que administrar a cadeia de suprimentos é como administrar as “várias logísticas” das empresas que se relacionam dentro da cadeia de um produto ou segmento.

O resultado esperado da aplicação dos conceitos tanto da Logística quanto da Gestão da Cadeia de Suprimentos é colocar os bens ou serviços na hora certa, no lugar certo, na quantidade certa, em condições corretas a um custo razoável.

A Logística trata desta questão de forma mais específica, focada nas operações da empresa sendo administrada, já a Gestão da Cadeia de Suprimentos trata de forma mais abrangente considerando as interações entre as várias empresas integrantes de uma cadeia produtiva.

O foco deste material estará dentro do conceito básico de logística, ou seja, considerando as questões de organização de fluxo de materiais dentro do ambiente de influência direto da empresa, sendo que a questão mais abrangente da cadeia de suprimentos será tratada de forma mais breve.

1.1.         Histórico da Logística

          Para iniciar o entendimento da Logística, é preciso considerar seu histórico de desenvolvimento. A Logística como uma grande área dentro da administração é de certa forma recente, sendo estudada de forma mais específica a partir da década de 50.

1.1.1.   Até 1950

A atividade de logística não era compreendida como um conjunto métodos organizados que buscavam melhor gerir o fluxo de materiais para a empresa, ela ainda era compreendida e utilizada de forma fragmentada pelos departamentos da empresa. Não havia um consenso de direção para gerir de forma a melhorar e garantir os fluxos de materiais, estando cada setor responsável por alguma parcela de responsabilidade.  Por exemplo, o transporte fica a cargo da produção, os estoques ficavam sob a batuta do marketing ou finanças, o controle de pedidos sob responsabilidade de vendas ou finanças, e não havia uma coordenação para integração das informações e ações tomadas, de modo que o resultado eram conflitos de interesses entre os departamentos.

 

O quadro a seguir ilustra alguns destes relacionamentos.

Quadro 1.1 – Conflitos nas empresas até a década de 1950

Apenas como exemplo vamos analisar algumas relações que ocorriam dentro das indústrias antes de 1950.

1.     Marketing queria trabalhar com mais estoques para sempre ter o produto disponível para o cliente; o departamento financeiro queria trabalhar com estoques reduzidos para onerar menos o caixa da empresa;

2.     Marketing queria trabalhar com lotes pequenos para ter variedade de produtos sempre disponível; A produção queria trabalhar com lotes grandes para reduzir o número de setups (troca de produto na produção);

3.     Marketing queria a entrega mais rápida para atender melhor o cliente; Finanças queria a entrega com menor custo para onerar menos os custos da atividade da empresa;

4.     Marketing queria que empresa tivesse mais depósitos espalhados para atender mais rapidamente o cliente; a produção queria que o estoque fosse centralizado para ter maior controle sobre ele;

Estes são apenas exemplos de situações que ocorriam e levavam a conflitos dentro da empresa antes da década de 50 porque ainda não havia o entendimento da Logística como uma grande área que deve ser administrada de forma global dentro da empresa.

Os estudiosos começavam a compreender a importância da atividade Logística como uma atividade abrangente e prioritária na indústria, e após a Segunda Guerra algumas empresas já a administravam assim.

1.1.1.   De 1950 até 1970

Foi o grande momento de desenvolvimento para a Logística. A economia estava em crescimento e surgiam novas formas de pensamento e administração. Se compreendeu a questão do custo total (que veremos posteriormente), onde deve- se considerar todos os custos ao se tomar uma decisão vinculada a aspectos logísticos.

Durante este período quatro grandes situações contribuíram para o desenvolvimento da Logística:

1.     Alteração na atitude dos consumidores:  Com o fim da segunda guerra mundial, ocorreu um aumento populacional e de consumo. As diversas tecnologias oriundas do período de guerra deram origem a novos produtos disponíveis ao consumidor, e no ocidente vitorioso ocorreu uma explosão na economia. Isso gerou uma explosão do consumo, tornando as metrópoles ainda maiores e levando também a atividade econômica intensa para regiões interioranas. Este cenário de pós-guerra e economia efervescente deu origem a sociedade do consumismo que temos atualmente. Maior variedade de produtos, produtos mais complexos, necessidade de atender diversas regiões antes não atendidas impulsionou o desenvolvimento dentro da questão logística;

2.     Pressão dos custos na indústria: A indústria já vinha se reinventando administrativamente desde o início do século com Frederick Taylor e Henry Ford. Já se tinham desenvolvidos diversos métodos organizacionais que visavam reduzir os custos das atividades operacionais industriais, e dentro deste cenário as empresas não sabiam mais para onde olhar para reduzir custos. Tendo a área operacional já “esgotado” suas alternativas, o caminho natural foi direcionar os olhos para a questão logística. Esta grande área que estava começando a ser descoberta e organizada ainda tinha muito a ser desenvolvida, dando possibilidade a grandes ganhos em relação a redução de custos.

3.     Avanço na tecnologia de computadores:  O advento dos computadores impactou a sociedade como um todo, e não poderia deixar de impactar também o desenvolvimento dentro da área logística. A maior complexidade das relações administrativas dentro da logística geravam problemas que eram difíceis ou muito custosos de serem resolvidos sem o auxílio computacional. O avanço e disponibilidade de sistemas computacionais permitiu as empresas administrarem e resolverem problemas logísticos em tempo recorde, problemas estes que anteriormente demandariam grandes esforços e muito tempo.

4.     A experiência militar:  Antes da indústria “descobrir” a logística como uma grande área complexa e vital que deve ser administrada utilizando soluções próprias, o militarismo já o fazia com grande maestria (a invasão da Europa na Segunda Guerra Mundial é uma das maiores e mais bem sucedidas operações logísticas já realizadas). No pós-guerra todo o conhecimento militar sobre a logística foi absorvido pelas empresas e indústrias.

 

1.1.2.   Além de1970

A logística se estabeleceu como uma grande área crucial na administração das empresas, e seus conceitos se disseminaram sendo aplicados e estudados nas organizações. A partir da década de 1970 o custo do petróleo aumentou o que pressionou ainda mais as empresas para conseguirem redução de custos logísticos.

Por volta da década de 1990 entraram na berlinda as preocupações com o meio ambiente e o impacto derivado das atividades logísticas. Foi necessário desenvolver tecnologias e práticas organizacionais que atendiam as necessidades econômicas, mas causavam menos ou nenhum impacto ao meio ambiente.

Atualmente diante da avançada tecnologia de comunicação e processamento de dados, tornando a comunicação facilitada, pressionou ao atingimento de melhores níveis de desempenho na administração dos estoques e transportes. Mesmo as pequenas e microempresas tem grande preocupação em organizar a logística de modo a reduzir seus custos operacionais e contribuir para saúde financeira para organização.

 

 

1.2.         As Atividades da Logística

A composição das atividades logísticas varia bastante de empresa para empresa, onde cada uma tem sua particularidade e foco.

Por exemplo, há empresas que tem o foco em grandes cargas distribuídas por todo Brasil utilizando-se de diferentes tipos de modais em função do tipo de produto, há empresas que são distribuidoras locais e trabalham com viagens mais curtas e veículos mais compactos, há empresas que se utilizam de serviços de transportes terceirizados ficando somente com a administração de seus estoques em sua operação etc.

As possibilidades são infinitas, mas apesar das empresas terem focos diferentes, a estrutura básica para organização e estudo da logística sempre será igual.

A estrutura conceitual da logística é dividida em atividades primárias e secundárias. As atividades primárias são as grandes áreas abrangentes dentro do conceito, e as secundárias são o detalhamento das atividades primárias.

As atividades primárias são três grandes áreas que compõe a estrutura do que conhecemos como logística, e são as seguintes:

·       Transporte: Refere-se aos vários métodos para transportar os produtos (rodoviário, ferroviário, hidroviário, aeroviário), como serão realizados, por quais roteiros, quando partirão, quando chegarão, quanto levarão, quais veículos levarão etc. De modo geral dois terços dos custos logísticos estão relacionados aos transportes, tornando esta área a que tem os maiores custos dentro da logística. Pode-se dizer que o transporte “adiciona valor de lugar” para o produto.

·       Estoques (armazenagem): Se a logística é administração do fluxo de materiais e informações, a administração dos estoques busca disponibilizar e organizar estes materiais para que sejam transportados. Os estoques podem ser entendidos como amortecedores entre a oferta e a demanda. Num primeiro momento podemos não ter esta noção, mas os estoques oneram fortemente o caixa da empresa (gasta-se muito com ele), assim, a administração dos estoques busca a melhor forma de organizá-los para mantê-los em níveis baixos sem comprometer o atendimento. O estoque “adiciona valor de tempo” ao produto.

·       Processamento de pedidos (informações): O processamento de pedidos é a engrenagem que faz a logística funcionar. Ele garante o fluxo de informações para que os materiais sejam armazenados e transportados. Diferente dos transportes e estoques, esta grande área da logística é algo intangível, mas é essencial para seu funcionamento. Os custos de processamento de pedidos tendem a ser menores comparados aos de transporte e estoque.

Estas três grandes áreas da logística são subdivididas em atividades secundárias que as delimitam. Estas atividades são:

1.     Armazenagem: Refere-se à administração do espaço para manter os estoques; a organização física dos locais de estocagem e sua localização na planta;

2.     Movimentação de materiais: Atividade que diz respeito a movimentação do produto no local de estocagem; seleção de equipamentos; procedimentos de como carregar e separar os materiais;

3.     Embalagem de proteção: Diz respeito a prover proteção ao produto durante todo seu manuseio dentro e fora da empresa.

4.     Obtenção (compras): Atividade que deixa os materiais disponíveis para a empresa. Trata da seleção das fontes de suprimentos, das quantidades a serem adquiridas, da programação das compras e da forma pela qual o produto é comprado. Obtenção basicamente é o fluxo de entrada do produto.

5.     Programação do produto: É o fluxo de saída do produto, a distribuição. Refere-se à quando e onde as quantidades devem ser fabricadas e enviadas.

6.     Manutenção de informação: Diz respeito a organização e disponibilização das informações inerentes e indispensáveis para a administração de um sistema logístico.

       A figura a seguir mostra a organização conceitual das atividades primárias e secundárias dentro da logística.

Figura 1.1 – Conceito da logística

A atividade de Processamento de Pedidos é representada pelo retângulo que abrange toda área da figura. Esta abrangência indica que esta atividade está permeando todos os processos organizacionais incluindo os relacionados aos estoques e aos transportes. O sistema não funcionará sem a disseminação da comunicação e das informações.

As atividades de estoque e transportes são representadas por círculos, cada um com suas atividades secundárias e uma intersecção entre eles. Esta intersecção representa que estas atividades, apesar de serem distintas, demandam a interação entre elas para que o sistema funcione, e muitas se misturam de forma que se torna indistintas entre si.

1.1.         Organização administrativa da Logística

Na prática dentro da empresa, o gerenciamento da logística ocorre baseado no modelo hierárquico da administração geral. Este modelo é dividido no nível estratégico, tático e operacional, que dentro da logística representam basicamente as seguintes atividades.

·       Nível Estratégico: Toma decisões sobre a configuração do sistema, escolha de modais de transporte, escolha de localização de armazéns, escolha de métodos de processamento de pedidos.

·       Nível Tático: basicamente é planejar a médio e curto prazo. No nível tático se faz todo o planejamento para que o sistema funcione. Determina-se quanto, onde e quando comprar, quais materiais devem estar em estoque, quais suas quantidades mínimas e máximas, quais momentos de embarcar, quais produtos embarcar etc. Este é o nível onde realiza-se todo o planejamento para que o sistema logístico funcione efetivamente.

·       Nível Operacional: Movimentar materiais nos estoques, carregar e descarregar caminhões, embalar produtos para carregamento, manter registros, preparar pedidos, enfim são as atividades diárias de operação do sistema. É neste nível que se coloca em prática tudo que foi planejado.

 

          A seguir é apresentado um quadro com algumas das atividades relacionadas a cada nível hierárquico dentro da logística.

Quadro 1.2 – Exemplos de atividades logísticas nos diferentes níveis hierárquicos da empresa

 

          Estes são apenas exemplos para caracterizar as atividades nos diferentes níveis hierárquicos que estão vinculadas a administração logística. 

conteúdo original: silva, i. L.L.; fundamentos para gestão da produção: o mínimo que você precisa conhecer; São Paulo; ed. do autor; 2024;