1. Planejamento, Programação e Controle da Produção
A atividade produtiva industrial, independente do segmento, tende a apresentar sistemas extremamente complexos para se administrar, principalmente em função da necessidade de gerir inúmeras informações e relacionamentos entre os processos produtivos e não produtivos.
A capacidade de organizar, planejar e controlar estes sistemas eficientemente é uma “ciência” que evoluiu e continua evoluindo ao longo do tempo, principalmente com o advento da informática e a rede de comunicação de computadores.
A partir de um sistema produtivo definido e organizado, pode-se considerar que o papel do Planejamento, Programação e Controle da Produção (abreviado como PPCP, mas sendo mais comum utilizar PCP) é organizar o fluxo de materiais e informações de modo a produzir as necessidades dentro dos prazos estipulados.
Para atingir o objetivo de planejar e controlar a produção adequadamente é preciso ser capaz de executar várias atividades na administração do fluxo de materiais dentro da planta fabril, dentre elas pode-se citar:
Pode-se perceber que a atividade de planejar e controlar o fluxo de materiais de um sistema produtivo é extremamente complexa, e torna-se cada vez mais difícil à medida que o sistema é maior, mais variado, ou mais instável.
Para compreender de maneira global a tarefa de planejar e controlar a produção, se recorrerá a um recurso gráfico facilitador.
A descrição de qualquer tipo de atividade desenvolvida pelo ser humano pode se dar pelo chamado modelo de transformação, onde são apresentados os recursos necessários para desenvolver a atividade (entradas), a atividade em si (processo), e os resultados de sua execução (saídas). Observe este modelo para a atividade do PCP a seguir.
Figura 1.1 – Modelo de funcionamento do PCP
Como comentado anteriormente, qualquer indústria é um ambiente extremamente complexo, e isso ocorre principalmente em função das diversas relações e fluxos de informações presentes no ambiente.
Na figura, estas relações são representadas entre os diversos departamentos (ou funções/processos) de uma indústria, que fornecem dados e informações (entradas), e o departamento de PCP, processa essas informações para gerir o fluxo de materiais (saídas).
Considere alguns exemplos baseados na figura:
· A Engenharia de Produto precisa fornecer informações referentes as especificações de materiais e desenhos do produto para que o PCP possa identificá-los na confecção do produto;
· A Engenharia de Processo precisa fornecer informações referentes aos roteiros de cada produto dentro da produção e seus tempos de processamento;
· A Manutenção precisa fornecer informações do plano de manutenção para que o PCP organize as paradas dos equipamentos sem prejudicar a produção;
· Os Recursos Humanos precisam fornecer informações de período de férias dos funcionários para que a produção não seja afetada em sua ausência;
· O Departamento de Compras precisa fornecer informações das matérias-primas e componentes comprados e seus prazos de chegada;
· O Recebimento precisa fornecer informações dos materiais que chegaram, suas quantidades e condições;
· A Expedição precisa fornecer informações de produtos acabados que foram disponibilizados pela produção e seu consequente despacho aos clientes;
· O Departamento Financeiro precisa fornecer informações com relação a entrada e saída de notas, além de recursos disponíveis para realizar eventuais investimentos em equipamentos e treinamentos para o pessoal;
A figura apresenta apenas algumas relações, mas as possibilidades são inúmeras. O que fica claro é a enorme dependência da atividade de PCP de dados e informações de diversos departamentos dentro da empresa.
Talvez o PCP seja o departamento que mais depende de informações de praticamente todos os setores.
Baseado nestas informações o PCP vai realizar planejamentos para pautar as atividades da produção, como por exemplo, desenvolvimento de previsão de demanda, planejamento a longo prazo (agregado), planejamento a médio e curto prazo (PMP), etc.
Além do planejamento por meio dessas ferramentas, o PCP também irá realizar o controle da efetivação das tarefas planejadas. As atividades de planejamento e controle serão detalhadas mais adiante.
Para gerir este volume de informações (que são dinâmicas, estão mudando a todo momento), a atividade de PCP dependerá de softwares computacionais ligados em rede dentro da empresa. Estes softwares são denominados Enterprise Resources Planning (ERP) e são tratados mais adiante neste material.
A função essencial destes sistemas são integrar todas as ocorrências e atualizações em um único local, de modo a estar sempre disponível e atualizada para quem as utiliza. Esses ERP’s apresentam módulos com funcionalidades para os diversos setores dentro da empresa, e claro, principalmente para o PCP.
Uma característica latente do PCP, é que em função de seu insumo de trabalho ser informações dos mais variados departamentos, é que ele se torna extremamente suscetível a falhas que ocorram nestes locais.
Por exemplo, uma falha de lançamento numa quantidade consumida do estoque de matéria-prima pode comprometer seriamente o planejamento da produção dos produtos que utilizam este material.
Qualquer setor dentro da empresa está suscetível a este tipo de situação, mas como o PCP tem relações com praticamente todos os setores, eventuais falhas em qualquer local podem afetar sua atividade diretamente.
Compreendida as relações e a função do PCP dentro da empresa, é importante fazer uma caracterização em relação as suas duas atividades essenciais: planejar e controlar.
· Planejar: No PCP a atividade de planejar consiste em coletar os dados e informações, analisá-los, e aplicar soluções por meio de métodos de modo a traçar um “futuro desejado”.
· Controlar: No PCP a atividade de controlar consiste em monitorar se tudo que foi planejado está acontecendo sem desvios, e quando há desvios, atuar para corrigi-los.
No planejamento olha-se para o passado e presente e projeta-se o futuro, no controle, deve-se gerir o presente observando seu comportamento e atuando quando necessário para seguir o planejado.
Como a atividade de planejamento está vinculada ao futuro, é preciso dimensionar qual a medida de futuro que se busca projetar. Pode-se querer projetar futuros mais próximos ou mais longínquos, assim é preciso conhecer os chamados Horizontes de Tempo que são considerados ao planejar.
· Horizonte de Curto Prazo: é o tipo de planejamento de ações mais imediatas, aquelas que tem seu curso muito rápido. De modo geral o curto prazo está relacionado a unidades de dias ou horas;
· Horizonte de Médio Prazo: é o tipo mais comum de horizonte de planejamento, no qual considera-se as ações e necessidades para que a produção continue funcionando plenamente. De modo geral o médio prazo está relacionado a unidades de semanas ou meses;
· Horizonte de Longo Prazo: é o tipo mais incerto de planejamento porque apresenta inúmeras incertezas em função tempo. De modo geral o longo prazo está relacionado a unidades de meses ou anos;
Já a atividade de controle se apresenta por meio das ações tomadas para monitorar a execução de todas as atividades planejadas e ações que corrigem os desvios quando estes ocorrem.
Na atividade de controle, ao se tomar uma ação, seja no monitoramento, seja na atuação para corrigir desvios, é preciso considerar a inércia da ação. Algumas ações apresentam o efeito (resultado) mais rapidamente, outras demoram mais, assim é preciso considerar esta inércia ao se tomar uma ação.
Deve-se sempre considerar se a inércia da ação é a necessária para atender a necessidade identificada.
Assim, considerando o desenvolvimento das tarefas no PCP haverá sempre uma divisão entre atividades de planejamento e controle, variando a intensidade de cada uma ao longo do tempo. A figura a seguir apresenta de maneira conceitual a interação entre elas ao longo do horizonte.
Figura 1.2 – Interação entre o planejamento e controle
A figura a presenta a divisão da intensidade de atividades de controle (cinza) e planejamento (branco) no PCP, observe as faixas verticais separadas por linhas tracejadas.
A extrema direita da imagem a faixa relacionada a unidade de tempo ‘anos”, observa-se que é dominada pela cor branca que representa a parcela de planejamento, e tem apenas uma pequena parcela cinza que representa o controle.
Isso indica que ao se considerar anos no horizonte de tempo, a maior parte do trabalho será de planejamento e muito pouco controle.
Na faixa referente a “meses” a parcela de planejamento diminui um pouco e aumenta-se a parcela da atividade de controle. Se deslocando a esquerda, passando pela faixa de semanas, dias, até horas o padrão se repete, diminui-se as atividades de planejamento e aumenta-se as atividades de controle.
Compreendida as características das atividades de planejamento e controle, e sua interação ao longo do horizonte de planejamento, observe na figura a seguir o comportamento desejado e o comportamento que tende a ocorrer dentro das empresas.
Figura 1.3 – Ideal x Usual
Considerando a atividade do PCP o ideal seria se tomar 80% do tempo realizando atividades de planejamento, o que tende a trazer planos consistentes e com grande aderência a realidade. Com este tipo de planejamento, o nível de desvios tende a ser baixo, e a parcela de tempo tomada para o controle (20%) se concentra basicamente no monitoramento, e na resolução de alguns desvios inevitáveis.
Infelizmente, na prática esse é um cenário que não ocorre com tanta frequência. O que usualmente ocorre é que se planeja de forma superficial (20% do tempo), o que leva a planos pobres, e consequentemente muitos desvios. Esses desvios fazem com que se passe muito tempo com atividade de controle (80%) para corrigi-los.
Esta situação acaba virando um ciclo vicioso, porque com mais problemas, há menos tempo para se planejar, o que leva a planejamento mais pobres, e que geram mais problemas.
A tomada de ação no PCP também deve considerar os efeitos da incerteza no horizonte de tempo no momento da realização das previsões.
Ao se planejar previsões, maiores serão as incertezas à medida que se caminha para o futuro no horizonte de tempo. Ou seja, previsões que consideram o curto prazo estão mais embasadas em dados e informações mais próximas da realidade, assim tendem a ter menos incertezas, já previsões que buscam o longo prazo, se baseiam em informações que estão muito distantes do que pode acontecer no futuro longínquo. A figura a seguir ilustra esta ideia.
Figura 1.4 – Incerteza no horizonte de planejamento
O efeito da incerteza é muito pesado no planejamento da produção, então busca-se formas de minimizá-lo. Para isso, ao se considerar planejamento de quantidades para o longo prazo, é preciso utilizar-se do recurso da agregação.
Agregar é buscar unidades de produtos mais generalistas, ao invés de buscar um detalhamento muito grande. Por exemplo, uma empresa que fabrica bolsas e mochilas, ao fazer uma previsão a longo prazo, não precisa detalhar as quantidades de cada modelo de produto, apenas projeta-se uma quantidade de bolsas totais, e mochilas totais.
Se nesta situação a empresa tentar detalhar a previsão de cada item singularmente pensando no longo prazo, muito provavelmente se terá uma incerteza elevadíssima, que com o passar do tempo se concretizará num erro também elevado.
Para ilustrar o efeito da agregação observe a tabela a seguir.
Tabela 1.1 – Exemplo de agregação
A tabela apresenta a previsão a longo prazo de seis modelos de mochila. A previsão foi realizada em janeiro de um ano qualquer, para janeiro do ano seguinte. Passado um ano, as vendas reais foram registradas e aparecem na tabela.
Como exemplo, a Mochila Enoch recebeu uma previsão de vendas de 325 unidades para janeiro de um ano no futuro, quando chegou e findou janeiro um ano no futuro foram registradas vendas de 256 unidades do modelo.
Calculando o erro da previsão frente as vendas reais têm-se:
Calculando os erros de todas as previsões, eles variaram entre -23,06% e 46%, o que são erros relativamente altos. Mas como mencionado anteriormente, ao se tratar de longo prazo é preciso agregar os produtos, ou seja, considerar uma unidade mais generalista.
Neste caso, se a previsão tivesse ocorrido somente sobre o total de mochilas que esperava-se vender daqui um ano o erro seria de apenas -1,58%, uma diferença considerável.
A utilização do recurso da agregação reduziu significativamente o erro das previsões de longo prazo, mas claro que à medida que o tempo passa e o horizonte vai se encurtando é preciso começar a detalhar a previsão para os diversos modelos de produtos.
Exploradas as questões básicas do PCP, como seu funcionamento, relações e horizonte de tempo, o quadro 22.1 resume as atividades e ferramentas associadas à sua realização.
Os métodos largamente explorados na literatura e utilizados na prática da indústria, quando corretamente aplicados desempenham o papel de organizar o fluxo de matérias dentro da produção.
Ainda com a correta aplicação dos métodos é inerente que desvios ocorrerão porque a confiabilidade dos planejamentos e execução não dependem exclusivamente da competência em aplicar os métodos. Como ilustrado no início, dependem das relações com toda a empresa, e de eventos aleatórios mais diversos.
Os métodos abordados nesse material buscam ajudar a estabelecer a organização necessária para funcionamento pleno da produção. Evidentemente quão melhor for a aplicação e acurácia frente a realidade, mais confiável e aderente o planejamento se torna. Planejamentos confiáveis são imprescindíveis para a gestão da indústria.